sábado, 17 de dezembro de 2016


Capítulo Três – Fatos



2 de Outubro de 2003

            Era duas horas da tarde quando Danilo resolveu sair um pouco de casa para tentar pensar em alguma coisa que não fosse aquela garota por quem estava apaixonado sem sequer ter visto uma vez na vida. As pessoas passavam parecendo não se importar bastante com nada que acontecia ao redor, como se nada importasse de verdade, ao menos era nisso em que Danilo pensava quando via alguém passando por ele com um semblante apático. Seu olhar crítico não o deixava imaginar o mundo de outra forma, ele julgava as pessoas como se todas fosse exatamente iguais uma as outras, como se todos fossem apenas “farinha do mesmo saco”. Ser uma pessoa muito reclusa fez com que ele olhasse o mundo com outros olhos, não com aqueles de pessoas normais que deixam escapar traços importantes das pessoas, mas digamos que Danilo conseguia perceber as piores partes de cada pessoa tendo apenas uma pequena conversa, o que ele já achava ser completamente normal.  Sentou-se em um banco qualquer que tinha numa praça pequena no bairro aonde morava, para ficar observando as pessoas que passavam por ai e tentar ver quantas não aparentavam estar felizes. Aquele era um lugar triste, pois, a praça em si não colaborava para aumentar o ânimo de ninguém. As folhas das poucas árvores que lá tinham estavam quase tão amarelas quanto uma casca de banana, o que não era nada comparado ao fato de que quase toda a quadra de futebol estava pichada e quebrada, que parecia ser ainda mais insignificante quando você olhava para a grama que lá tinha e percebia que havia lixo em quase toda parte. O abandono daquela praça era notável até por alguém que apenas a visse por poucos segundos, pois, tudo nela estava podre, e assim Danilo julgava todos que lá passavam incluindo ele mesmo.                                   

            Na frente desta praça ficava o colégio público mais abandonado de toda a cidade de João Pessoa. Era um cenário deprimente para qualquer pessoa, mesmo que esta não tivesse muita sensibilidade. A grade cinza estava em boa parte arrancada, e o pouco que ainda sobrava estava torto ou enferrujado. Não havia portão naquela escola, pois, sempre que o governo colocava um portão novo, as pessoas quebravam um pouco depois de colocarem, ou alguns vinham á noite para fazer isto. Não havia diretores na escola, sequer professores e muito menos alunos. Além de que toda a parte externa e interna da escola estava pichada, e havia boatos de que ali se realizavam rituais de grupos satânicos todas as sextas feiras, o que Danilo era curioso para saber se isto acontecia realmente, mas nunca teve coragem de ir. O lixo consuma totalmente aquele lugar, tendo desde comida jogada fora, embalagens plásticas, vidros que eram provavelmente de bebidas ou lixo hospitalar. As pessoas que deveriam ter ao menos um pouco de bom senso, apenas faziam colaborar para que aquela situação se agravasse, jogando cada vez mais lixo lá dentro. Danilo de alguma forma se sentia confortável neste banco, olhando para esta escola.

            Aquele foi um dia marcado por uma chuva fina, que quase não deu uma trégua para as pessoas que buscavam sair. Danilo adorava chuvas, porque o som que ela fazia era de uma melancolia extrema, como se trouxesse um sentimento agradável para si, mas ele sabia que não era bom. Seus olhos que ao mesmo tempo possuíam a determinação de um guerreiro que acabara de sair para uma guerra em que o destino do mundo estava em jogo, possuíam uma tristeza de uma pessoa amarga que não possuía nada na sua vida. Esta dualidade fazia com que tudo fosse complicado, pois a mesma coisa que o fazia ficar feliz era a coisa que o fazia ficar triste, o que era simplesmente inexplicável para Danilo. Ele queria ao menos poder ver o rosto daquela garota, mas o fato de que ela provavelmente nunca vai querer ver ele, o deixava totalmente desanimado, como se tivesse perdido completamente o chão. A chuva caia no chão assim como a vontade de ir procurar a garota caia em um abismo profundo, no qual se guarda aquelas ideias que você nunca vai executar mesmo sabendo o quanto quer fazer, você simplesmente vira as costas e jura para si mesmo que não se importa. Danilo estava muito pensativo naquele momento, talvez estava formulando algum jeito de encontrar esta menina em algum lugar, ou talvez estava apenas preso na sua grande “caixa do nada”, que era um lugar em que não havia nada além de um branco total e uma paz para poder esquecer um pouco as coisas. O mais estranho era que aquele era um lugar muito diferente daqueles que a maioria das pessoas procuram quando estão querendo pensar em algo, pois aquele lugar inteiro te dava uma sensação de mal estar enorme, e haviam notícias que diziam que algumas pessoas haviam se suicidado ali.  

            Depois de algum tempo ali parado, Danilo notou que alguma pessoa tinha se sentado ao seu lado e estava o observando, e o que mais o deixava curioso era que ele não tinha percebido a chegada desta pessoa. Então ele ajeitou-se no banco, para então criar coragem para falar com aquele indivíduo misterioso.

-Faz muito tempo que você está aqui? – Perguntou Danilo

=Não tanto, você estava ai perdido em pensamentos que pareciam te deixar desnorteado, então não quis te atrapalhar, até porque eu mesmo ficaria com raiva se alguém fizesse isso – Respondeu

-O que você faz aqui? , acho que nenhuma outra pessoa em sã consciência viria a um lugar como este em um dia chuvoso – Perguntou Danilo, querendo não demonstrar que estava receoso com aquele indivíduo.

-Eu gosto de lugares como este. Como eu quero ser escritor algum dia, acho que devo andar em todos os tipos de lugares, para depois falar sobre eles. Ah, e meu nome é Tiago. – Respondeu Thiago, dando um leve sorriso após ter se apresentado.

-Meu nome é Danilo. Eu não acho que lugares como este vão inspirar alguma coisa de útil, pois tudo que eu penso agora é em como eu vou fazer algo que parece ser impossível – Falou Thiago, com um grande tom de tristeza.

            Thiago ficou olhando um pouco para uma árvore que tinha perto de onde eles estavam, deixando sua mente vaguear por ai enquanto seus olhares estavam totalmente fixos naquela árvore. Depois de um certo tempo, Thiago notou uma certa inquietação em Danilo, como se ele não quisesse estar mais ali, como se a sua presença não fosse mais bem vinda. Então ele apontou para a árvore que estava observando e disse:

-Você consegue ver o passado ao olhar para algumas coisas? , ou o que ela realmente é por fora de todas as máscaras? – Falou Thiago.

-Não consigo, mas não entendi aonde você está querendo chegar falando estas coisas. – Disse Danilo, aparentando estar muito confuso com aquilo – Por algum acaso você consegue? –

-Eu acho que consigo um pouco – Disse Thiago, interrompendo para ajeitar um pouco a sua touca vermelha. – Mas olhe para esta árvore, você acha justo julgar ela apenas por causa da aparência atual dela?, talvez ela já tenha sido uma árvore muito bonita algum dia, mas o tempo tirou toda a beleza dela, como um ladrão que tira os pertences da sua vítima. O tempo é o maior inimigo das pessoas, e parece que quanto mais o tempo passa, mais as coisas ficam feias e sem cor, ao menos é isto que eu acho. Temos que ver as pessoas por quem elas realmente são, e não por quem elas querem aparentar ser, como você que estava sozinho em um lugar como este, provavelmente ninguém além de você sabe do que se passa na sua cabeça, e você não ousaria contar pelo fato de que as pessoas poderiam te achar estranho. Você como muitas outras pessoas, está apenas usando uma máscara para esconder quem você realmente é, talvez para proteger a si mesmo de alguma coisa, não sei. Mas é justamente como a árvore, ela está se escondendo em máscaras velhas apenas para as pessoas olharem para ela e pensarem que ela é simplesmente uma árvore normal, mas no fundo ela é uma árvore triste que não fala para ninguém além de si mesma. Esta comparação não deve ter ficado muito boa, mas acho que é o suficiente para você entender tudo que eu quero falar. Ou acabamos com os problemas, ou eles acabam conosco. –

            O silêncio tomou conta do lugar, como aquelas visitas que vem apenas para passar alguns minutos e acaba começando a morar na casa. Danilo estava absurdamente surpreendido por todas as palavras que Thiago acabava de dizer. Era incrível o fato de que uma pessoa que aparentava ter a mesma idade que a dele, tivesse uma visão de mundo muito superior a pessoas com mais idade que ele. Os adolescentes naquela época não ligavam muito para nada, queriam apenas se divertir a qualquer custo, nem que fosse com bebidas ou qualquer outra droga. Danilo estava com receios, mas depois do que ele ouviu, tudo que ele poderia fazer era admirar totalmente aquele cara que havia acabado de conhecer. Depois de um tempo, Danilo resolveu quebrar aquele silêncio:

-Estou realmente surpreso, não achava que havia uma pessoa que fosse mais ou menos da minha idade, que tivesse um pensamento diferente de todas as outras pessoas, eu estou realmente surpreso. –

            E enquanto eles conversavam, a chuva continuava caindo lentamente no chão como se nunca fosse parar. E assim começou a amizade daqueles dois rapazes, que mal sabiam o que o futuro os reservava.



11 de Abril de 2005

            As coisas pareciam ter se normalizado entre Danilo e Thiago, mas o clima ainda estava um pouco tenso entre os dois, e isto dava para facilmente ser notado se você observasse o fato de que os dois estavam em lados opostos no quarto, cada um fazendo uma coisa totalmente diferente. Os pratos sujos da pizza que havia sido comida no dia anterior ainda estavam em cima da mesa, a garrafa de refrigerante que agora estava seca ainda estava em cima da mesa, e nenhum dos dois pareciam estar preocupados com isto, como se não importasse nem um pouco com isto. O guarda-roupas de Thiago estava bagunçado, pois ele havia revirado muita coisa para procurar um antigo mangá de Naruto para ler, que acabou não achando, e deixando toda aquela bagunça lá. Danilo que parecia o que estava menos se importando com toda a bagunça do quarto, estava lendo um antigo romance que havia levado para Thiago ler, mas depois daquilo que havia ocorrido, ele desistiu da ideia de emprestar e acabou decidindo que iria ler de novo aquele romance. Thiago, por sua vez, estava no seu computador procurando mais notícias relacionadas com o que havia acontecido no festival. Até que em certo momento, quando as coisas pareciam estarem totalmente perdidas, Danilo olhou calmamente para Thiago, e então disse:

-Desculpe-me por ter sido tão grosso contigo, mas acho que ainda tenho uma forte ligação com aquela garota, e não estou pronto para ver ela novamente. –

-Que isso cara, não precisa se desculpar. O único que precisa de desculpas aqui sou eu, que fui um tanto quanto insistente sobre um assunto que eu sabia que você não iria gostar. Vou deixar esta coisa toda de investigação de lado se você quiser – Disse Thiago, enquanto ia fechando todas as abas do navegador.

-Aquilo tudo com ela foi como uma mentira, pois é isto que o amor sempre pareceu para mim, uma grande mentira. Você não precisa se desculpar, caro amigo. Vamos investigar isto a fundo, eu iria adorar que ela tivesse feito algo de errado, pois além que quebrar a imagem quase perfeita que eu tenho dela, iria servir como uma vingança. – Disse Danilo, com os olhos fixos em Thiago.

- Ela nunca foi perfeita, nada no mundo é perfeito, cara. Vamos então investigar tudo que podemos na internet, vou precisar da sua ajuda para coletar o máximo de informações. Será que? .... – Disse Thiago, com uma grande pausa no final.

-Não vá dizer que você acha que ... – Disse Danilo, olhando para Thiago com uma cara de espanto

-Sim, acho que isto é bem possível. Comecemos a pesquisar, vou colocar Metallica aqui para podermos pesquisar com inspiração. Mas claro, temos vários suspeitos disto, não vamos tirar conclusões precipitadas. – Disse Thiago, rindo bastante.

            Danilo então pegava um antigo notebook seu, que havia deixado na casa de Thiago caso precisasse para fazer algo, o que era o seu caso, Teve que procurar bastante pelo seu carregador, que era uma das únicas coisas que ninguém sabia por onde andava, e ele não poderia usar um notebook descarregado. A pequena bagunça que já havia se instalado no quarto ficou ainda maior, porque com o tempo Danilo foi começando a perder a paciência de procurar, começando a ignorar que ali devia ser um quarto totalmente arrumado e limpo. Mas após algumas horar procurando, Danilo achou o seu carregador atrás do guarda-roupas de Thiago, que é um lugar que ninguém nunca pensaria encontrar um carregador.

            Eles passaram o resto do dia inteiro pesquisando sobre o assunto, e de quando em quando um alertava ao outro sobre algo importante que havia descoberto, ou uma das vítimas que tenha saído com vida que tenha falado algo interessante sobre, naquele ponto qualquer fator era crucial para eles. Os semblantes de cansaço estavam deixando claro que eles haviam passado o dia esforçando-se, mas a pior das notícias é que mesmo com tudo aquilo eles não acharam nada de útil, nada que fosse realmente importante para eles. Tudo que haviam pesquisado apenas evidenciavam que aquilo deveria ter sido causado por alguém, mas nada que falasse quem pudesse ter sido o causador daquela tragédia, o que deixava os dois frustrados depois de tanto esforço. Mas passado um pouco a frustração, eles voltaram a pesquisar freneticamente, sem sequer parar para dormir ou sequer cochilar. Eles passaram a noite inteira pesquisando, buscando novos sites que pudessem falar algo que eles já não sabiam, tentaram entrar em contato com alguma pessoa que houvesse presenciado o acontecimento, mas nada disso foi o suficiente, pois, nenhuma dessas coisas deram resultado, eles apenas perderam uma noite de sono procurando uma coisa na internet que eles não conseguiram achar.

             Após passarem quase 24 horas pesquisando como loucos na internet, eles acabaram se rendendo ao sono após um almoço que ambos julgaram “divino”, que havia sido feito pelo pai de Thiago, que era cozinheiro de um grande restaurante da cidade, mas hoje ele estava de folga e decidiu fazer um almoço diferente, como forma de recompensar o esforço que os dois garotos haviam dado. Eles achavam que aquilo era muito importante, e que se eles pudessem descobrir o verdadeiro culpado daquilo, iriam ser considerados grandes heróis. Eles sabiam que haviam pessoas da polícia muito mais preparadas que eles, e que eles teriam muita facilidade naquele caso, mas nem por isto eles chegaram a pensar sequer um segundo em desistir daquilo. Era como se o problema chamasse por eles, como se tivessem enfeitiçado eles, e este era um feitiço do qual eles não conseguiam sair.

4 de outubro de 2003

 - Assim que esta porta fechar, fecha-se com ela também a minha vida e tudo que está nela. Não sou dramático, apenas um pouco. Direi adeus á todos estes orixás que estão aqui em casa, e me despedirei também de todos os cantos da casa que eu costumava ficar, a fim de não deixar esta vida sem me despedir de tudo que importa para mim. Não olhe para mim com estes olhares de pena, eu também sinto apenas pena da minha pessoa, e acho que isto é tudo, tudo é isto. Certa vez eu fiquei com uma vontade parecida com esta, mas era apenas besteira de criança, pelo fato de que minha mãe não queria me dar o brinquedo que eu queria, mas agora é muito diferente, não acho que vou conseguir suportar isto assim tão fácil, então é melhor acabar com isto de uma vez, não acha?. Vou dar adeus para todos os sonhos que um dia eu já tive, e para todos os objetivos de pessoa iludida, e além de que também tenho que dar adeus para as minhas diversas tentativas de fazer algo que ninguém nunca fez, e me despedir da esperança que nunca tinha me deixado. – Falou Danilo, enquanto olhava fixamente para Thiago.

-Se você realmente quiser fazer isto, uma pessoa como eu não seria capaz de fazer nada para te impedir. Acho que você se importa demais com todos os detalhes, Danilo. Você deveria apenas não se preocupar com tudo isto, deixar para lá e pensar em qualquer outra coisa. Ás vezes me sinto alheio ao mundo, entende?. Não que isto vá te servir de algo, mas eu poderia te mostrar umas histórias que eu escrevi tempos atrás, que fala um pouco sobre este sentimento. Tenha dó de si mesmo, Danilo. Aquela garota nem valia tanto assim, e além disto, você nunca viu ela pessoalmente, então porque ficar com saudades de algo que você sequer viu ou tocou?. Você vai perder algo muito precioso que é a sua vida, por algo que sequer vale a pena.

            O quarto de Danilo estava totalmente escuro. Eles olhavam vagamente para o teto enquanto conversavam, como se vissem algo de realmente interessante ali, naquele lugar aonde só se via uma única cor, uniformemente distribuída pela casa. Havia um pouco de vidro quebrado no chão, encostados na parede, bonecos estes que Danilo costumava falar que era a raça humana em seu princípio, quando o que ele acreditava ser o criador fez os humanos. Danilo dizia que os humanos foram feitos do vidro, e que isto explicava o fato deles serem tão frágeis, tão descartáveis, e que tudo que faziam era refletir o que estava perto deles. Havia um mapa do brasil colado na parede, em frente a cama, que Danilo costumava ficar observando quando não tinha nada para fazer, era uma espécie de passatempo para ele, uma coisa estranha que mesmo sem fazer muito sentido, acaba te deixando bem de certa forma.

            Eles estavam um pouco cansados de estarem apenas deitados, olhando para o teto, então Danilo surgiu com a ideia de que eles poderiam sair um pouco, para andar sem destino por ai. Thiago hesitou um pouco antes de aceitar a ideia, pois ele nunca tinha andado pelas ruas de noite, achava que tudo era muito perigoso por ali, e que iria acontecer alguma coisa ruim se ele saísse. Eles foram então para a Rua do Sol, que nada mais era que uma rua perto da casa de Danilo, em que você poderia ver o sol nascendo, se você estiver na rua no momento em que ele estiver surgindo. Era um Lugar que Danilo costumava ir quando se cansava de ficar o dia inteiro no computador, o que era um pouco raro, mas ele acabava sempre gostando de ter ido. Era uma rua normal como todas as outras ruas, exceto por todas as suas casas antigas que até hoje são bem conservadas, ou pelos antigos postes que não possuem nenhum sinal de vandalismo, o que era muito difícil de se ver em um tempo aonde os vândalos atacavam quase todos os bens públicos. Havia uma casa nesta rua que se destacava um pouco das outras, não pelo fato de ser mais bonita que as outras, ou mais antiga, mas ela se destacava por uma simples frase que estava escrita no seu muro. Era a principal atração daquela rua para Danilo, pois, ele nunca havia visto o nascer do sol daquela rua, pelo fato de que ele estudava de manhã, e precisava dormir para ir ter mais um dia torturante na sua escola. A frase havia sido escrita com cerâmica, uma cerâmica vermelha que já estava bastante desgastada por causa do tempo, mas nunca havia deixado de ter seu brilho. A frase era a seguinte: “Você já viveu hoje?”. Aquela frase deixa Danilo muito reflexivo, pois ele começava a pensar se ele estava realmente vivendo, ou se estava apenas ocupando um lugar no tempo e no espaço, como tantas outras pessoas. Mas toda essa reflexão nunca o levou a conclusão nenhuma, só alimentou mais outras reflexões que alimentaram mais outras reflexões, como uma hidra que tendo sua cabeça cortada, recebe duas novas cabeças no lugar aonde havia apenas uma. Aquela frase parecia que causado um grande impacto em Thiago, que permanecia em silêncio desde o momento em que a leu. Ele olhava para o céu, olhava para as casas da rua, para a quase insignificante quantidade de lixo que havia naquela rua, e depois voltava o olhar novamente para a frase, buscando entender a real mensagem que ela queria passar, ou ao menos uma resposta para ela, mas isto ele julgava praticamente impossível.

-De modo lógico – Disse Thiago – Nós vivemos sim hoje, pois não estamos mortos, o que caracteriza a vida. Mas se formos pensar de outro modo, poderemos pensar que a frase se trata de perguntar se nós nos sentimos vivos hoje, ou então se nós aproveitamos a vida. Não estou conseguindo refletir muito bem sobre isto, minha mente meio que está em um lugar distante. -

            Eles apenas ficaram ali olhando aquela frase, cada um nos seus próprios pensamentos, cada um no seu próprio mundo particular, tão distintos e tão parecidos. Era tarde para as pessoas, mas muito cedo para cada um dos dois, e foi nesse momento tão silencioso que todas as palavras não ditas pareceram começar a fazer sentido. Eles haviam apenas lido uma frase, nada que fosse totalmente fora do comum, mas apenas isto serviu para mostrar que a vida é curta, e que se você não aproveitar, você não estará vivendo. Danilo então olhou para Thiago, sorrindo, como quem estava falando: “eu finalmente entendi”, enquanto Thiago fez o mesmo, no mesmo instante. Ficaram ali os dois, numa rua qualquer, enquanto tudo começava a fazer sentido.

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